Deixou sua aldeia natal com pouco mais de onze anos, os amigos a contemplá-lo. Recusou-se a olhar para trás. Pois se olhasse, não partiria – lembrou António Joaquim Fernandes meio século depois, em cena recriada talvez com excessiva dramaticidade. Já havia então abandonado seu lusitaníssimo Antônio Joaquim pelo nome mais marquetável de Roberto Leal.
Respeitáveis diplomatas e políticos brasileiros e portugueses sem dúvida muito fizeram para desenvolver as relações entre os dois Estados. Mas, do ponto de vista dos dois povos, o cantor e compositor Roberto Leal pode ser considerado a pessoa que no último meio século mais contribuiu para aproximar as duas margens lusófonas do Atlântico.
Simbolizava em si mesmo as flutuações de economia e poder entre dois países fora do centro das decisões mundiais. Nascido em Trás-os-Montes, veio ao Brasil na grande vaga de migração portuguesa que fugia da economia rateante do salazarismo, enquanto o Brasil era uma das regiões que em média mais crescia no Planeta. Anos depois, com as endêmicas crises econômicas nacionais, retornou a Portugal, mantendo-se em ponte aérea pelo restante de sua vida.
A mídia a partir dos anos setenta o divulgou como “cantor português”, o que é não só reducionista como injusto, a começar de sua prosódia. Conscientemente ou não, criou um falar próprio, que mesclava elementos dos sotaques dos dois países, e é com esse idioma lusófono muito particular que ele cantava. Quanto a chamá-lo de fadista, basta ouvir fadistas de raiz para perceber que não é o caso. Roberto cantava um fado com outra sensação, abrasileirado – melhor ainda, um fado Roberto Leal. Dessa forma atingiu os dois povos.
Muito carinho a Roberto Leal, ponte entre duas culturas.
Publicado do Diário do Nordeste online em 16/09/2019
Também considero que Roberto Leal foi um grande embaixador de Portugal no Brasil e do Brasil em Portugal.