Paulo Avelino
Os fãs do filme “Casablanca” lembrarão. O casal Ingrid Bergman e Humphrey Bogart se reencontra na cidade marroquina. É tempo de guerra e o lugar regurgita de refugiados. Gente empobrecida e amedrontada se acotovela à espera de uma permissão para fugir da Europa.
O clássico do cinema não revela a Odisseia dos fugitivos. Tinham de atravessar vários países. Tinham de ter passaporte. Visto de saída de alguns países. Visto de entrada em outros. Visto de passagem em terceiros. Alguns só davam visto depois que se mostrasse a passagem para o destino comprada, mas para muitos a companhia de transportes exigia o visto do destino antes de vender a passagem. E para cúmulo alguns exigiam atestado de boa conduta do país de origem. Imagine-se uma vítima da perseguição nazista a pedir atestados para a Gestapo.
Em parte como resposta aos horrores vividos pelos refugiados na Segunda Guerra a ONU patrocinou a assinatura a 28 de julho de 1951 da Convenção relativa ao status dos Refugiados. O Brasil foi dos seus primeiros subscritores. Na época os refugiados eram problema fundamentalmente europeu, e essa convenção se limitou a refugiados na Europa em decorrência de fatos ocorridos até 1950. Com o drama dos refugiados a se espalhar pelo mundo, em 1967 um Protocolo retirou essas limitações geográfica e temporal.
A principal cláusula da Convenção é a do “non-refoulement”, ou seja, o princípio de que a pessoa a buscar asilo não pode ser simplesmente mandada de volta. Se alguém chega a uma fronteira e diz que quer fazer turismo, a autoridade do país hospedeiro pode recusar entrada por alguma irregularidade documental. Mas se alguém diz que quer cruzar a fronteira pois teme por sua vida, isso não pode acontecer. Pois se raciocina que o turismo é um luxo. A vida é um direito fundamental.
Refugiados são algumas vezes vistos como perigosos e indesejáveis. Pois nunca se imagina que, no futuro, são os habitantes do país hospedeiro que possam estar em má situação. Assim o problema dos refugiados se confunde com o problema da empatia do ser humano – colocar-se no lugar do outro. Para evitar que situações de pesadelo como aquela do filme Casablanca sigam a ocorrer no mundo.
Publicado no jornal Diário do Nordeste em 06/08/2021