Evento: Todo dia todo lugar
A Infelicidade berra. Já sua prima Felicidade é a epítome da discrição – office-boy a transportar uma pérola, salva-se em usar um jeans roto no Metro a bocejar – os batedores de carteira não imaginam que leva uma fortuna.
Mas a Infelicidade, ah, como fala. E faz História. Machado e Eça falavam de adultérios, Tolstoi de guerras, Shakespeare de adolescentes tresloucados, Balzac de avarentos e os trágicos gregos então nem pensar. Só um fala de Felicidade, o Paraíso da Divina Comédia, e nem esta parece ter muito assunto: Dante enche linguiça com descrições de luz ou de vidas de santos – fora os sorrisos de Beatriz que, venhamos e vamos, é uma chatinha.
Mas não se precisa ler o Dom Casmurro ou o Primo Basílio, Guerra e Paz, Romeu e Julieta, Hamlet ou o Édipo-rei para encontrá-la. A Infelicidade meteu-se na Política. Nunca nada está bem – a inflação está alta ou empregos estão baixos ou os salários estão baixos ou as guerras estão em alta – e a solução, evidentemente, sou Eu – dizem deputados e Presidentes.
Ah, antigamente as coisas eram melhores – a Felicidade, segundo a Infelicidade, esconde-se sempre no Tempo passado ou Futuro ou em outras pessoas – Ah, a minha infância, ou se ao menos a Maria Ângela (ou o José Ricardo) do Terceiro Ano me sorrisse. Que fujona.
Enfim, ao contrário do que se pensa, a Felicidade possui o grave pecado do egoísmo – enquanto a Infelicidade generosamente se distribui pelos cotovelos. Se isso é Infelicidade ou não, deixo para cada qual decidir.