Dele lembro pouco, na verdade nada. Lembro do time. O mais duro que o Brasil pegou na Copa de 1970. Aquela Inglaterra, que time chato. Batiam para valer e tinham um paredão de goleiro – um dos maiores gols perdidos por Pelé foi naquele jogo. Mas tinham outro grande jogador: Bobby Charlton, cujo falecimento a mídia britânica noticiou ontem.
Um jogador campeão da Copa de 1966 pode parecer uma realidade distante para nós. Mas algumas das conquistas do povo brasileiro vieram da classe à qual pertencia.
O pai de Bobby Charlton trabalhava nas minas de carvão. Ele acompanhava o pai nas sextas, dia de pagamento. Via os homens prestes a se afundar naqueles buracos. Pareciam miseráveis. Via os que saíam. Pareciam aliviados. De vez em quando eram empurrados para guerras. Em um só dia na Primeira Guerra Mundial, a chamada batalha do Somme, morreram vinte mil deles. Vinte mil. Quem sobrava voltava para as minas.
Aquela classe não ficou parada. Formaram um partido de centro-esquerda, o Partido Trabalhista. Ganharam as eleições de 1945. Estatizaram as ferrovias. E decidiram que ninguém iria mais morrer por falta de médico: criaram o Serviço Nacional de Saúde, inspiração do SUS.
Bobby Charlton é filho desse meio de lutadores. Que eles nos inspirem.
E mesmo com as conquistas a vida continuou dura. No dia em que fez dois gols nas semifinais da Copa, seu pai cavava minério a 250 metros abaixo da terra. Já tinha pedido uma folga para ver o filho, e achava que pedir outra seria perigoso.