A Criação de um país

A Criação de um país

Paulo Avelino

DUGGAN, Christopher. História de Itália: desde 1796. Lisboa, Portugal: Edições 70, 2021. 760p. Tradução de Miguel Mata.

Em um domingo de 1796 um rapaz de 26 anos entrou a cavalo na cidade de Milão. Não se pode dizer Milão, Itália, pois esta não existia: era uma mistura de repúblicas, ducados, grão-ducados, marquesados, reinos, e de quebra os Estados Pontifícios, difíceis de classificar. O rapaz não vinha só – com ele vinham os seus soldados, um tanto lamentáveis. Usavam uniformes rasgados, alguns não tinham armas e os cavalos semelhavam esqueletos. A humildade no entanto não se estendia ao discurso: seus superiores tinham dado a eles a grandiloquente missão de libertar o país e quebrar os seus grilhões. Seu chefe era o tal rapaz de 26 anos. Foi assim que Napoleão entrou na Itália.

O historiador e italianólogo britânico Christopher Duggan estabeleceu o momento acima para começar o seu livro porque segundo ele naquele momento se começaram a plasmar as condições para a criação a partir dessas pequenas unidades políticas o país atual. A Unificação Italiana não foi fácil nem curta, e segundo alguns não terminou até hoje. O livro é um grande discurso em torno desse processo.

A prosa escorreita do autor chama a atenção para os personagens da Unificação. Como as damas Madame du Stael, que percorreu o país acompanhada de dois cavalheiros, sendo um o idoso guia intelectual e outro o jovem amante; e Eleonora Fonseca Pimentel, a única mulher entre os líderes de uma revolta, que recitou Virgílio ao subir para o enforcamento. Também os artistas, como o romancista Alessandro Manzoni, que tinha terror de trovoadas, poças d´água e ruído de pardais, e ao surgirem as crises de pânico saía a caminhar acelerado e chegava a fazer quarenta quilômetros em um dia, embora também tivesse pavor que o chão se abrisse por baixo dos pés. Ou como Giuseppe Verdi, que surfou na onda do patriotismo com suas óperas e que tinha uma verdadeira fixação por heróis, e foi mudando de ídolo em ídolo na medida em que a política mudava.

Além é claro do herói midiático perfeito antes de haver mídia: cabelos louros, olhos azuis, lenço ao vento, o invariável blusão vermelho e um ar de nonchalance, Giuseppe Garibaldi se afirmou como o Herói de Dois Mundos, inclusive do Brasil, ídolo dos patriotas, ídolo das garotas, que tornou Garibaldi ou Garibaldino dois dos nomes mais populares para meninos na época. Quanto a meninas, um dos nomes mais queridos era Anita – a sua mulher brasileira.

Claro, nem todos os personagens são simpáticos. Mussolini é parte importante, assim como os que participaram ou permitiram seus crimes, como o Rei Vitor Emanuel II. A complicada relação entre o Norte e o Sul do país também chama a atenção, pelas semelhanças com a relação entre o Nordeste e o Sul/Sudeste do Brasil, inclusive com paralelos que se podem traçar entre as tragédias de Canudos e de Pontelandolfo, um lugarejo perto de Nápoles.

Pela extensão do assunto a obra não podia é claro passar de uma introdução – mas é boa introdução, e deixa o leitor com desejo de saber mais sobre o país.

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