Hoje el dos de febrero de Dos mil y veinte y dos tomo a liberdade de lançar a candidatura de certo Luiz Vaz de Camões: conhecido como poeta, nascido talvez em 1524, falecido em 10 de junho sem que ninguém se tenha dado ao trabalho de anotar direito se em 1579 ou 1580, náufrago no rio Mekong, sem um olho, e autor de manjadíssimas frases como “As Armas e os Barões Assinalados” e “Alma minha gentil, que te partiste”. Lanço [antes que algum aventureiro o faça] sua candidatura a estafador, ou enrolão.
A ocasião mais propícia ser não poderia. Certo catedrático aposentado de letras hispânicas no University College London doou ao Instituto Cervantes de Londres um manuscrito de 24 páginas, supostamente do século XVII, supostamente autêntico e supostamente de um chato sobre os malefícios do Teatro. O documento, encimado pelo eufemístico título de “Abusos de Comedias y Tragedias”, desenrola diatribes sobre esta forma de expressão, apodada de Peste espiritual para as almas.
Tal descoberta [não é difícil prevê-lo] dará margem às mais disparatadas candidaturas de autoria secreta, a maior parte de celebridades, desde Michelangelo até a rainha Vitória [quem disse que o documento é mesmo do século XVII?]. Por isso, e embora Camões tenha escrito duas ou três peças [o número é incerto], coloco sua candidatura, sendo divertido imaginar um artista a esculachar uma forma de expressão artística, ou porque acreditasse na crítica ou porque todo poeta é um fingidor, como disse outro poeta.