2023 03 24 – O esporte das quietas multidões

Evento: Portugal 4 x O Liechtenstein, 23/03/2023, estádio do Sporting, Lisboa

O público pinga a partir de uma hora e meia antes do início da partida para se transformar em fluxo de dezenas de milhares de pessoas a sair depois dela. Em todas as fases o mesmo perfil: muita criança com os pais, muitas jovens, gente com a palavra turista parece que impressa na testa, rapazes com cara de bom menino, alguns idosos. Bandeiras, só padronizadas e pequeninas. Barra limpa, brigas zero. Filas quilométricas porém silenciosas nas lanchonetes de preços inflacionados.

Era Lisboa mas poderia ser Madri, São Paulo, Londres (onde tudo começou), Roma ou Estocolmo, sempre com pequenas variações. O futebol mudou, desde Zico (que vi jogar) a Cristiano Ronaldo (que vejo). Mais que o jogo mudou a plateia.

Nada de saudosismo: no Maracanã de 1980 havia as bandeiras enormes e diversas, os fogos a ensurdecer na entrada dos times, as batucadas às vezes enervantes que não se calavam nem um segundo, e a torcida do Fluminense a jogar copinhos de plástico cheios de talco a perfumar e encher o ambiente de névoa. Mas havia brigas ou ameaça, muitos bêbados, caras às vezes ameaçadoras e banheiros insuportavelmente sujos.

Hoje existe uma figura impensável antes – o animador de torcida. Um homem muito loquaz que começa a berrar pelo microfone antes do jogo e que vai até seu final. E enquanto ele não fala, toca-se música animadinha. Impensável e desnecessária antes – as torcidas eram um espetáculo.

Hoje nos tornamos civilizados. Um tanto aborrecidos mas civilizados, de qualquer forma.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *